Apicultura: Uma atividade em vias de modernização

A apicultura na Guiné-Bissau está enraizada nas comunidades rurais e faz parte da cultura alimentar, medicinal e espiritual. Esta atividade encontra-se numa fase de transição para o modernismo, com o apoio dos projetos de cooperação para o desenvolvimento, sobretudo nas regiões leste (Bafatá e Gabú) e norte (Oio e Cacheu).

Pelo que se constatou, a apicultura nessas regiões é uma atividade de grande importância socioeconómica e cultural, que, atualmente, se encontra numa fase transitório, marcada pela coexistência de práticas tradicionais e esforços de modernização, impulsionados por associações e projetos de desenvolvimento que atuam nessas zonas.

Contudo, a maioria dos apicultores nas comunidades rurais ainda segue métodos apícolas tradicionais, que muitas vezes se assemelham à “caça” de mel. Sendo que, o mais grave é o saqueamento de mel de colónias de abelhas selvagens, que consiste no derrube de árvores e a destruição de colónias inteiras para a colheita de mel, utilizando em muitos casos o fogo, o que constitui sérios riscos de incêndios florestais incontornáveis, com forte ameaça à floresta e fauna, assim como aos bens das próprias comunidades.

Além do mais, esse sistema de extração de mel gera menor qualidade, limitando ainda o volume de produção a longo prazo, aliada ao desperdício do produto durante o processo de extração. 

Apesar dos desafios que pairam sobre o processo de extração, o mel é uma das principais fontes de rendimento para os apicultores tradicionais e é parte integrante da cultura alimentar, medicinal e espiritual das comunidades rurais, o que torna essa atividade extremamente importante para a economia das famílias

Modernização do setor

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O repórter do Nô Pintcha constatou também que as regiões leste e norte são zonas de intervenção de projetos de cooperação que visam transformar apicultura, tronando-a mais rentável e sustentável.

Entre os projetos, destacam-se Apicultura Inclusiva, no leste do país, financiado pela União Europeia e pela Cooperação Portuguesa, atuando nas regiões de Bafatá e Gabu.

Este projeto está focalizado na realização de cursos de formação de formadores para jovens raparigas e rapazes, de forma a incentivar a prática moderna da apicultura; apoiar e incrementar a produção e comercialização de produtos à base de mel, como papas e sabão; trabalhar em parceria com os apicultores de leste (Apileste), fortalecendo sua estrutura.

Outros projetos de sustentabilidade e abandono da caça ao mel nas regiões norte e leste, com o apoio da Federação KAFO, visam erradicar esse procedimento tradicional de extração, através de disseminação de técnicas de apicultura sustentável e da difusão de apiários comunitários (colmeias Quenianas e Langstroth), beneficiando centenas de apicultoras nessas regiões.

Estas iniciativas envolvem apicultores tradicionais para que, gradualmente, abandonem as práticas destrutivas, permitindo a produção de mel de forma sustentável, sem destruir árvores ou causar incêndios.

Também há outras iniciativas como o programa “Nô Firmanta”, do PNUD que apoiam empreendedores que dedicam à produção de mel orgânico, usando tecnologias modernas e processamento de subprodutos.

Política e legislação

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O setor da apicultura na Guiné-Bissau é reconhecido tanto na sua importância socioeconómica quanto no contexto da preservação ambiental, o que o insere na política e nos planos de desenvolvimento ligados ao setor da floresta e fauna.

A apicultura é explicitamente mencionada na Lei Florestal guineense como uma atividade que deve ser promovida e não prejudicada, o que demonstra o seu reconhecimento oficial.

No entanto, a lei florestal classifica a apicultura como uma atividade acessória livre, juntamente com a colheita de plantas medicinais, alimentares, lenha e frutos silvestres. Assim, nas florestas, a apicultura é regida por práticas e normas consuetudinárias, o que reconhece a importância cultural e o envolvimento das comunidades locais.

Segundo consta da lei florestal, apesar de apicultura ser considerada atividade livre, mas ela deve ser exercida de forma a não causar danos ou pôr em perigo a sobrevivência das espécies e do terreno, alinhando-a com o objetivo geral da política florestal de promover a gestão durável dos recursos e a proteção do ambiente.

Porém, a apicultura é vista como um importante pilar para o desenvolvimento sustentável na Guiné-Bissau, devido a sua contribuição económica e social, combate à pobreza, preservação dos ecossistemas e da biodiversidade.

Por isso, ela é frequentemente incluída em projetos de desenvolvimento, focalizados na agricultura sustentável, adaptação às mudanças climáticas e conservação.

Apesar do Plano Nacional de Desenvolvimento 2020 focar mais em questões macroeconómicas e infraestruturas, os Planos de Ação e Estratégias Nacionais para a Biodiversidade destacam a importância do uso sustentável dos recursos naturais e da conservação, onde a apicultura moderna se enquadra.

Assim sendo, a Direção Geral de Floresta e Fauna é a entidade fundamental na coordenação da política florestal e na fiscalização dos recursos, o que inclui a regulamentação das atividades que ocorrem no domínio florestal, como a apicultura.

Entretanto, a política de desenvolvimento nacional reconhece a apicultura não só como uma prática económica legítima, mas também como meio de alcançar objetivos de conservação ambiental e de melhorias rurais, exigindo que a sua prática seja sustentável e compatível com a preservação da fauna (abelhas) e do setor florestal.

Conceito

O conceito de mel é definido de forma rigorosa pela biologia, química e, principalmente, pela legislação alimentar internacional, que busca garantir sua pureza e qualidade.

Segundo a legislação internacional, a definição mais aceite e utilizada para fins de comércio e controle de qualidade, como a estabelecida pelo Codex Alimentarius e replicada por diversas legislações nacionais, o mel é a substância doce e natural produzida pelas abelhas melíferas e outras espécies de abelhas.

Produto de exportação

Colmeia-guineense Apicultura: Uma atividade em vias de modernização

Segundo informações disponíveis, o mel guineense, com suas caraterísticas naturais e orgânicas, tem potencial para ser um produto de exportação com valor agregado sob marcas como “Badjudessa”, associada a projetos no leste do país.

Aliás, além do mel, a apicultura permite a produção e comercialização de cera de abelhas e própolis, diversificando as fontes de receita e as atividades económicas.

De acordo com ambientalistas, a transição da “caça ao mel”, sistema puramente tradicional/rudimentar para a apicultura sustentável (moderna) é o passo fundamental para que a Guiné-Bissau possa explorar todo o seu potencial e colher os benefícios económicos, sociais e ambientais desse “ouro” líquido natural extremamente importante para a vida.

Benefícios para saúde

De acordo com os técnicos de saúde e nutricionistas o mel é um alimento natural de alto valor nutricional e medicinal, muito apreciado e com benefícios comprovados.

O mel com baixo teor de humidade, pH ácido e presença de peróxido de hidrogénio (antisséptico), ajuda no tratamento de feridas e no combate a infeções.

O mel atua como um agente calmante, lubrificando a garganta e reduzindo a irritação, sendo um remédio popular e eficaz para gripes e resfriados.

É rico em fito nutrientes, vitaminas B e C e antioxidantes (flavonoides), ajuda a fortalecer as defesas do organismo. Ele possui efeito pré-biótico, promovendo o crescimento de bactérias benéficas no intestino, ajudando na regulação do sistema digestivo.

É uma fonte de energia natural e de rápida absorção. Além disso, pode contribuir para o bem-estar, ao estimular a produção de serotonina (neurotransmissores do prazer).

Perante esses valores, é importante incentivar a atividade apícola no país, permitindo mais emprego para jovens e combater a pobreza no meio rural, com reflexos diretos na melhoria da qualidade de vida das populações e, em especial, a saúde humana, através de aproveitamento dos importantes benefícios de mel.

Texto e fotos: Djuldé Djaló

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