Eleições: Falta de meios inquieta Comunicação Social

As eleições legislativas já estão à porta. As movimentações começaram e estamos na contagem decrescente para o início da campanha eleitoral, previsto para o dia 13 de maio. Todas as atenções estão voltadas para o dia 4 de junho, data de ida às urnas.

O assunto está mesmo a nublar a famosa campanha de comercialização da castanha de caju em curso. Tal como o produto estratégico e base da economia guineense, as eleições mexem com a vida de todos os setores do país.

Nesse sentido, a Comunicação Social, uma das classes mais importantes no processo democrático, e não só, faz parte daquelas que estão em preparativos para as eleições legislativas de 4 de junho do ano em curso.

Para tentar saber o ponto da situação dessa preparação, tendo em conta que a cobertura eleitoral exige isso mesmo, o jornal Nô Pintcha foi ouvir as organizações da classe jornalística nacional.

Assim, o presidente do Conselho Nacional da Comunicação Social falou das diligências que a instituição tem feito desde a marcação das eleições, tendo entabulado contactos, quer a nível interno, quer a nível externo, nomeadamente na sub-região com vista a procurar apoios para a cobertura eleitoral.

Domingos Meta Camará destacou a necessidade de uma preparação prévia da classe jornalística, através de reciclagens sobre a cobertura eleitoral, evitando assim o “habitual reboque” (transporte, alimentação, entre outras necessidades) que os repórteres vão por parte dos partidos políticos e candidatos, o que traz peso de consciência e põe em causa o profissionalismo.

Para pôr cobro à essa situação, o CNCS começou a bater portas para procurar meios aos órgãos para um trabalho com “mais isenção, profissionalismo e imparcialidade”, tal como regem a ética e deontologia profissionais.

Foi por isso que, segundo o presidente, o órgão preparou e submeteu projetos aos seus parceiros, nomeadamente embaixadas e organizações sub-regionais, tais como a UEMOA, mas ainda não há respostas. Recorreu-se também à Presidência da República para o mesmo fim. E dentre esses pedidos, só a República Popular da China prometeu apoio em equipamentos.

Meta Camará garantiu que, se houver meios, vai-se disciplinar a questão de linguagem durante a campanha, porque basta “meia palavra desenquadrada”, poderá haver consequências imprevisíveis. Para evitar isso, repisou a importância de reciclar os jornalistas para estarem melhor preparados para lidar com questões eleitorais.

“Os partidos vão à caça ao voto, mas alguns usam linguagens inapropriadas. Será que esses insultos trazem benefícios ao país? Não. Você tem que convencer o seu eleitorado com projetos concretos. Os jornalistas devem saber isso”, alertou, referindo que há quem saiba, mas as condições de trabalho podem fazê-lo esquecer.

No entanto, o dirigente reconheceu dificuldades de se conseguir financiamentos mesmo da parte dos parceiros, lembrando que o governo ainda nada fez, numa altura em a Comissão Nacional de Eleições também tem os seus problemas e está limitada. A título de exemplo, apontou a não realização das campanhas da educação cívica a poucos dias das eleições.

A nível de Bissau, Meta Camará informou sobre o agendamento de encontros com os órgãos de comunicação social para procurar soluções, como forma de “não banalizar a profissão” do jornalismo.

Entretanto, o Nô Pintcha sabe que o Ministério da Comunicação Social também tem os seus planos para apoiar os órgãos na cobertura eleitoral, mas ainda não há fundos disponíveis. Segundo conseguimos apurar, o ministro Fernando Mendonça quer evitar que os jornalistas viagem a reboque dos partidos concorrentes, para permitir que haja um acompanhamento mais isento e profissional.

Apelar responsabilidade aos jornalistas

O vice-presidente da Confederação Nacional das Organizações de Imprensa, CNOI, Malam Biai, em entrevista ao Jornal Nô Pintcha, apelou aos jornalistas a despirem sensacionalismo e proximidade política para vestirem a camisa da profissão com rigor, verdade e justeza.

“A CNOI agenda promover algumas formações visando detalhar pormenores sobre a cobertura eleitoral”, disse.

Malam Biai assegurou que a preocupação da sua organização é dotar os órgãos de comunicação social, sejam eles estatais ou privados, de independência económica e com linhas editoriais próprias para permitir a transparência e equidade no desempenho da profissão. 

Trabalhar livremente e de forma independente

Por seu lado, o Sindicato de Jornalistas e Técnicos de Comunicação Social (Sinjotec) também elaborou “um projeto complemento” e entregou a diferentes entidades que têm apoiado a Guiné-Bissau nas eleições, mas ainda sem resultado concreto.

Em entrevista exclusiva, a presidente Indira Correia Baldé priorizou a formação. Uma componente importante, tendo em conta que “o período eleitoral é extremamente sensível, que mexe com a vida do país, mexe com tudo e todos”.

A seu ver, os jornalistas devem estar muito bem preparados para enfrentar esse desafio, porque “cada eleição é uma eleição e cada reportagem é uma reportagem”, pelo que faz todo o sentido ter pessoas à altura.

“O nosso setor está sempre a ter pessoas novas e algumas terão a primeira experiencia nas próximas eleições. A elas falta ferramentas e experiências de como lidar com o processo. Precisam conhecer a Lei Eleitoral, há aspetos que devem saber e muitos que agora exercem a profissão são principiantes, nunca lidaram com esse processo” referiu.

Deu conta de encontros tidos com alguns parceiros, onde foi manifestada a disponibilidade de ter meios para subsidiar os repórteres e prometeu continuar a bater portas.

Correia Baldé falou na necessidade de conseguir apoios financeiros, com vista a reduzir, para já, “a dependência dos jornalistas” para com os partidos políticos que vão acompanhar durante o processo eleitoral. Infelizmente, disse, alguns pensam que quando vão de boleia dos candidatos é porque devem entregar-se, fazendo o que eles querem.

Adiantou que o Sinjotec quer que os jornalistas trabalhem livremente e de forma independente, mas obedecendo a ética e deontologia profissionais.

Órgãos completamente de rastos

O bastonário da Ordem dos Jornalistas lamentou que na Guiné-Bissau não haja uma carta económica para o processo de mediação, ou seja, para a produção de uma notícia, onde os órgãos de comunicação social estão completamente de rastos.

De acordo com António Nhaga, os Media devem estar à altura para corresponder com espectativas dos seus jornalistas, o que lamentavelmente não existe.

Na sua opinião, os órgãos que representam a classe precisam de congregar para conseguir um apoio financeiro, para monitorizar o ato eleitoral, mas para isso concretizar, tem que haver um único projeto e até se pode chamar de ‘Projeto de Jornalistas’ para mediatização das eleições. “Não há necessidade para cada organização da classe ter o seu projeto”. Havendo um único projeto, “só a classe é que vai ganhar”.

“Mediatização de forma independente e transparente, por exemplo, colocar três ou quatro transportes em cada região do país para os jornalistas, com os seus respetivos perdiens, para fazer cobertura de comícios dos candidatos nessas regiões, sem que sejam ofertados boleia dos políticos ou dos partidos e de lá, esse jornalista passa a trabalhar de forma independente e não depende de nenhuma formação política ”, disse Nhaga.

António Nhaga chamou a atenção ao jornalistas que, quanto divididos, mais problemas têm e vai cada vez mais favorecemos ao Estado. Contudo, o processo de mediatização é fundamental para a democracia de cada país e, quem faz isso é o jornalista, que tem a obrigação de saber quanto ganha.

No seu entender, deve-se evitar o termo “jornalista de público ou privado”, que só contribui para dividir os jornalistas, porque jornalista é uma profissão. Como exemplo, apontou que o jornal Nô Pintcha é uma empresa de Estado e o jornal O Democrata é uma empresa privada, mas o que se faz lá é o jornalismo. “É isso que tem que se unir, porque todos são jornalistas”. Aliás, disse que a classe jornalística está cada vez mais dividida, por causa das divergências dos partidos políticos.

Segundo Nhaga, quer queiramos ou não, haverá troca de insultos entre os políticos, situação que não deve interessa aos jornalistas, mas sim mostrar ao povo no processo de mediação aquilo que é verdadeiro sistema democrático, quem traz o bem para a população. “Era bom que essa divergência dos partidos não metesse na imprensa, ou seja, não deve fazer fretes a essas pessoas”, disse.

Informar de forma responsável

O presidente do Sindicato de Profissionais dos Órgãos Públicos de Comunicação Social (Sinpopucs), Domingos José Gomes, disse que a realização das eleições é um trabalho normal para os jornalistas. Aconselhou aos profissionais no sentido de exercer cabalmente as suas missões de informar de forma isenta e responsável

Domingos Tiago, como é vulgarmente conhecido, considerou de precária a situação laboral dos jornalistas dos órgãos públicos, questionando como é que o Estado pode exigir transparência nos trabalhos jornalísticos, sem que haja condições de trabalho e motivação aos técnicos.

No entender do presidente do Sinpopucs, o Governo deve criar condições para que os profissionais não dependam dos candidatos, começando no pagamento de perdiem, transporte, toda a logística e não acontecer isso, facilmente o jornalista pode ser corrompido pelo poder político. “o Governo tem a responsabilidade de criar condições suficientes para os jornalistas exercerem os seus trabalhos na integra, sem que sejam corrompidos”.

Tiago disse que nesse momento em que as eleições se avizinham, a Radiodifusão Nacional e o jornal Nô Pintcha dispõem somente uma viatura cada, tal como a Agência Noticiosa da Guiné, mas esta última sem condutor.

O sindicalista afirmou que sendo assim, não há condições para cobrir as eleições, independentemente de não haver sinal dos perdiens para os jornalistas que vão ao terreno, que ao depender dos partidos está sujeito mais a ser militante do que um profissional propriamente dito.

Associados vão ser treinados

A presidente da Associação das Mulheres Profissionais da Comunicação Social (Amprocs) afirmou que a organização que dirige está a diligenciar juntamente com o Movimento da Sociedade Civil junto do PNUD, através da Célula de Monotorização de Eleições, para cobertura das legislativas próximas.

De acordo com Paula Melo, a Amprocs vai ser incluída nesse projeto para assumir o trabalho da educação cívica e capacitação política, onde as suas associadas vão ser treinadas na cobertura das eleições de forma profissional e distante dos políticos.

Em termos da segurança das mulheres jornalistas durante o processo, aquela responsável disse que um dos objetivos da criação dessa organização, é o facto de existir abuso e assédio sexual por parte dos políticos, no momento da campanha eleitoral.

Melo aproveitou a ocasião para aconselhar a todas as mulheres jornalistas no sentido de dignificar a si mesma perante os políticos e sobretudo durante a campanha eleitoral, onde o dinheiro está a circular.

Ibraima Sori Baldé e Fulgêncio Mendes Borges

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