Corra, Mohamed Salah! A história por trás do egípcio que virou Rei em Liverpool

Salah pôs educação de lado e enfrentou nove horas diárias de viagem para virar jogador. Com 29 golos, é o artilheiro da Premier League e herói de um Egito que voltou à Copa três décadas depois

Mohamed Salah, quando garoto, queria ser jogador de futebol. E não havia quem fosse capaz de convencê-lo a desistir da ideia. Fã de Ronaldo, Totti e Zidane, seus três principais ídolos, ele era irredutível. Mas almejar isso no Egito é como querer viver de críquete no Brasil, de surfe na Noruega ou de qualquer outro esporte num país sem tradição para tal. Para estar entre os melhores, ele tinha em mente que o caminho seria tudo, menos fácil – teria que desbravá-lo. E não viu outra saída senão correr.

A princípio, no sentido figurativo: Salah correu atrás do sonho, mesmo com percalços aos montes. O primeiro contrato profissional foi assinado aos 14 anos, no Al Mokawloon. O centro de treinamento do clube, situado na capital Cairo, ficava a quatro horas e meia de viagem de Nagrig, sua cidade-natal. Portanto, ele peregrinava por nove horas, cinco dias na semana, para ir e voltar dos treinos.

É óbvio que a educação ficou em segundo plano. Diante da exaustiva maratona, Salah obteve uma carta que o autorizava a ficar apenas duas horas no colégio. Do contrário, não chegaria a tempo para treinar.

Em campo, Salah corria – agora no sentido literal. Era um velocista desde pequeno. A exemplo de Gareth Bale, do Real Madrid, começou na lateral-esquerda. Mas Said El-Shishini, seu treinador ainda na base, conta que teve motivos para acreditar que o jovem renderia melhor no ataque, principalmente depois de uma partida em que perdeu cinco oportunidades claras, de frente para o goleiro. Havia demasiado desperdício de energia, ele argumentara. O resultado após a mudança de posição lhe deu razão: Salah terminou o campeonato com 35 gols.

Continuou correndo, porém cada vez mais na direção do gol. Por consequência, balançar as redes virou rotina. O lateral que virou atacante, aos 16 anos, recebeu o convite para fazer parte do elenco profissional do Al Mokawloon. Ali caíra a ficha de que o sonho de se tornar jogador era palpável, como declarou em entrevistas ao longo da carreira. Toda aquela romaria valera a pena.

Na temporada seguinte, 2009/10, Salah era titular e destaque. O menino de 17 anos evidentemente tinha algo que o sobressaltava em meio aos outros egípcios. Ganhou confiança – guarde bem essa palavra. A equipe terminou o campeonato daquele ano em 11º e, do ano seguinte, em último. Mas a aventura do nosso personagem na segunda divisão foi curta graças a um episódio que marcou a história do futebol do Egito.

Da tragédia, a esperança

O massacre no Estádio Port Said em fevereiro de 2012, que ocasionou a morte de 74 pessoas, é uma mancha. Naquele dia, um equívoco de quem era responsável pela segurança transformou o palco da partida entre Al Masry e Al Ahly numa praça de guerra. Os campeonatos do país foram suspensos por dois anos em decorrência da tragédia, deixando jogadores de futebol sem calendário. Salah entre eles.

Àquela altura, as boas atuações por sua equipe haviam rendido prestígio. Ele passou, por exemplo, a ser chamado para as categorias de base da seleção nacional. E um clube ou outro demonstrava interesse. Mas precisava jogar para dar sequência a tudo isso. Foi então que, em março, o Basel marcou um amistoso contra a seleção sub-23 do Egito. As palavras são de Bernhard Heusler, presidente do clube suíço na ocasião:

– A única razão de querermos aquela partida era a chance de ver Mohamed Salah in loco. Nunca vou esquecer o que eu vi naquele campo, ficamos tão impressionados. Ele foi incrível – contou ao site britânico “Sky Sports”.

– Eu nunca havia visto um jogador com tanta velocidade na minha vida inteira – completou.

Dizem que Salah correu tanto naquele dia que só parou quando assinou o contrato de quatro anos com o Basel. A porta de entrada para a Europa estava aberta, e o clube que escolhera fornecia o ambiente perfeito: uma liga de pouca expressão onde ele poderia se destacar; e frequência assídua nas duas principais competições europeias.

– Quando você sai do Egito para a Europa, você não fala a língua, sua família está no Egito, e viajar para vê-la é difícil. Mas o que estava claro desde o início é que eu não queria voltar até ser um jogador de alto nível… ou aposentado (risos). Eu sabia que não tinha opção de retornar, não me via jogando alguns meses na Europa e voltando. Isso nunca passou pela minha cabeça – declarou em entrevista ao espanhol “Marca”.

No Basel, Salah atuou por pouco mais de uma temporada e marcou 20 gols em 79 partidas. Sob o comando do técnico Murat Yakin, brilhou principalmente na Liga Europa ao marcar um dos gols que ajudou a eliminar o Tottenham nas quartas de final. Depois, nas semis, também fez contra o Chelsea, mas a equipe foi eliminada com duas derrotas (2 a 1 e 3 a 1).

 Transferiu-se justamente para o Chelsea na temporada seguinte. Definitivamente sua pior passagem por um clube. Nos Blues, Salah não dispunha da confiança de José Mourinho, que, por sua vez, pouco depois acabou por ceder o egipcio para Roma campeonato italiano.

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