– Assalto a São João
Vivia-se uma aparente tranquilidade em Fulacunda, Tite e São João-Bolama, quando de repente, em finais de Dezembro de 1962, se irrompia em São João uma coluna de três Jeeps carregados de militares armados provenientes de Tite. À primeira vista, parecia o habitual grupo de recolha de pão enviado de Bolama, no porto de São João. Afinal, os objectivos do esquadrão dos tugas era outro. Eles acusavam a população de esconder e sustentar os “terroristas”.
Subitamente começou a balbúrdia enfurecida por tiros indiscriminados contra a população indefesa. Queimaram habitações, colheitas e mataram animais. Quem pudesse escapar fugia para as matas. Prenderam pessoas e mataram idosos e doentes. Invadiram e cercaram a casa do chefe da tabanca de Cantem, Neganá, que se tinha ausentado para Bolama, mas que, desafortunadamente, no regresso cruzou-se com aquele vendaval e foi morto. Em Telen-Pudjunguto, os tugas atacaram campos de cultivo e mataram o lavrador de nome Mankotsoh Nancassa na presença de sua mulher e filhos.
Três dias depois, os tugas voltaram a atacar através de uma emboscada montada à entrada de Cantem, tendo conseguido surpreender um grupo de mancebos nacionalistas da tabanca de Colónia, que se dirigia à morança do curandeiro Patron Barbosa, em Gamarque. A rapaziada conseguiu escapar a cilada, pondo-se em debandada pelos lados de Gã-Djomonter e, depois, atravessando para Bambaia.
O terror colonial, as perseguições e detenções arbitrárias transformaram a secção de São João num povoado fantasma, estradas obstruídas, com casas abandonadas ou queimadas. Obrigaram a fuga massiva da população para as matas, deixando a vida administrativa e a actividade comercial profundamente afectadas
Depois do atatque ao quartel de Tite, na madrugadaa de 23 de Janeiro de 1963, seguidodo derrube do capitão Curto no meso dia, em pleno dia, na descida de Serra Leoa, transformaram a zona num pequeno inferno para a movimentação do exército colonial, devido a constantes emboscads dos guerrilheiros comandandos por Malam Sanha, sedidados na base de Gã-Tongho.
O estado de isolamento em que ficaram as aldeias facilitou maiores infiltrações e movimentações folgadas dos nacionalistas na zona. O assalto ao Posto Administrativo de São João, foi protagonizado por Malam Sanhá, Arafam Mané e Quemo Mané e no qual também participaram Fernando Badinca e Adão. Foi no primeiro trimestre de 1963, depois do ataque de Tite. (…)
Sem dificuldades, os nacionalistas conseguiram apoderar-se de duas viaturas, um Range-Rover, pertença do Chefe de Posto e um camião Bedford, da casa Gouveia, levados para a base de Gã-Tongho.
A contra-ofensiva colonial na base de Gã-Tongho
À partir do assalto de Tite, o grupo de Malam Sanha ganhou tanta coragem, auto-estima e os guerrilheiros alimentaram ainda mais estímulo e convicção do arranque vitorioso de uma das mais destacadas epopeias das guerras de libertação em África, a seguir à da Argélia contra os franceses. Conhecendo o inimigo que estavam a enfrentar, os nacionalistas decidiram multiplicar as emboscadas fechando as estradas e intimidando o exército colonial. Para tal, instalaram uma base distinta de outras anteriores (que eram mais esconderijos móveis do que bases sólidas e visíveis). Os guerrilheiros estavam excessivamente motivados e induzidos a erros de pouca experiência de guerrilha, deixaram de se esconder nas matas e instalaram a primeira maior base dentro da tabanca de Gã-Tongho, localizada nos extensos e frondosos mangueiros do tumbum. Dalí partiam quase diariamente em pequenos grupos para as emboscadas nas estradas de São João-Entroncamento (Nova Sintra); Tite-Entroncamento; e de Entroncamento-Fulacunda. Durante 3 meses de existência da base, o recinto da base estava repleto de indivíduos entre guerrilheiros, novos aderentes à guerrilha e os homens das tabancas em arredores que iam visitar seus familiares ingressados e as jovens raparigas que abasteciam-lhes de água e comida. A agitação era maior e mais empolgante nos fins-de-semana.
No campo de futebol da tabanca, haviam actividades de preparação física dos jovens recrutas, com exercícios combativos, munidos de miniaturas de pequenos troncos esculpidos em forma de armas de combate, com as quais aprendiam a manejar esses materiais. A acção era de tal ordem aberta que os instrutores ousavam gritar em altas vozes de comando e os recrutas os correspondiam, entoando canções de bravura de Malam Sanha e seus companheiros. – ‘’PAI qui na manda, marabóó, Mansanhá qui na luta, marabòò‘’… Até outros curiosos e a miudagem podiam ir espreitar aos domingos. As mensagens que circulavam eram as que asseguravam aderentes à guerrilha e às populações de que a guerra não iria durar muito tempo, porque os nacionalistas iriam tomar o território logo a seguir. Uma questão de meses – afirmava-se.
Há 17 quilómetros das cidadelas de Tite a norte e de São João na poente, os guerrilheiros estavam possuídos de um ambiente de extrema autoconfiança e euforia que só por si, denunciavam-se a si próprios, atraíam as movimentações das avionetas de reconhecimento, o que era um convite directo às perseguições pelo inimigo.
Era iminente que iria acontecer, mais cedo ou mais tarde. Pois, o assalto e aprisionamento das duas viaturas, somado ao caso de Tite, outras humilhações em emboscadas fulminantes nas estradas, a exposição dos guerrilheiros em exercício de treinamento ao ar livre e a céu aberto em Gã-Tongho e seus arredores, (antes da entrada em acção do fogo aéreo colonial) irritaram, ainda mais, os tugas ao ponto de recorrerem
Foi assim que, por via dos informantes e das avionetas, os tugas localizaram, essa base de Gã-Tongho. Passado pouco tempo depois do ataque de Tite, (presumivelmente em finais de Abril ou início de Maio de 1963), aconteceu a primeira e maior conta-ofensiva do exército colonial contra a base de Gã-Tongho.
(…) Continua na próxima edição