O diretor regional da Agricultura de Bafatá, Óscar Vaz, apontou a falta de fertilizantes, aliada às inundações de espaços produtivos em várias bolanhas (motivadas pelas fortes chuvas que caíram no ano findo) e a insuficiência de meios, como factores que comprometeram a campanha agrícola 2022 na região.
Uma situação que preocupa os serviços regionais da Agricultura de Bafatá que apontam a redução de quase 20% do rendimento das colheitas, contrariamente às previsões iniciais que indicavam para uma boa colheita.
As constatações do diretor regional da Agricultura de Bafatá foram avançadas em entrevista exclusiva ao semanário estatal “Nô Pintcha”, tendo apontado ainda a pandemia do COVID-19 e a guerra russo-ucraniana como outros fatores que influenciaram nos maus resultados da campanha agrícola.
Acrescentou que a pandemia e o conflito russo-ucraniano agudizaram a crise mundial, reduzindo os apoios e, sobretudo, as importações de fertilizantes, cuja maioria vêm desses países em conflito.
A subida de preço de combustível também foi mencionado pelo diretor como factor negativo que influenciou a ação da Direção Regional da Agricultura que, de certa forma, dificultou os trabalhos.
Em termos de equipamentos agrícolas (tratores), a Direção Regional da Agricultura conta com 11 máquinas que prestaram serviço de lavoura nos diferentes setores administrativos da região, reforçados com outras máquinas dos privados.
Segundo Óscar Vaz, mesmo com este número de máquinas, não conseguiram atender as muitas solicitações de agricultores, o que levou a Direção Regional a traçar um plano de prestação de serviços de forma a satisfazer minimamente as solicitações a que estavam confrontados.
Disse que, antes do final da campanha, 7 desses tratores tiveram avarias, o que dificultou a sua instituição de cumprir cabalmente com a sua responsabilidade.
Receitas
O diretor sublinhou outras dificuldades que têm a ver com as receitas geradas com os serviços prestados pelos tratores durante a campanha de lavoura que, segundo ele, cobraram um preço de 12.500 francos CFA por hora, o que proporcionou uma receita considerável. Mas, mesmo assim, essas receitas não conseguem cobrir as despesas ligadas à compra de combustível, manutenção das máquinas e subsídio dos operadores.
Deparam também com a dificuldade de atender as demandas, devido as dificuldades de organização dos agricultores que, por vezes, uma pessoa pede serviço de tractor numa zona, apenas só para uma ou duas horas de tempo, o que não é rentável.
Assim, a Direção Regional da Agricultura adotou um plano de agrupar os agricultores solicitantes em número suficiente por zona, para deslocar a máquina, evitando assim disperdícios. Essa estratégia ajudou melhor a organização dos trabalhos, explicou o direitor.
Sementes agrícolas
Em termos de sementes, o diretor disse que foram fornecidos sementes diversas aos agricultores, tais como arroz, feijão e milho basil. Igualmente, as horticultoras beneficiaram também de sementes hortícolas diversas tais como cebola, pimenta, suculbembe, repolho, cenoura e tomate.
As sementes foram fornecidas no âmbito do Projeto de Urgência da Segurança Alimentar e distribuidas aos agricultores previamente recenseados. Todos os apoios recebidos visaram reforçar a capacidade produtiva dos agricultores e, consequentemente, contribuir para o aumento dos seus rendimentos, para além de garantir a segurança alimentar e nutricional, cuja interferência do fator natureza tem ditado a sorte diferente, pois as fortes chuvas provocaram inundações nos campos agrícolas, sublinhou o diretor.
Disse que a semente de mancara não foram distribuídas nessa campanha na região, porque não havia quantidade suficiente para atender todos os interessados.
Por outro lado, o diretor criticou os agricultores relativamente a questão de falta de adubos. Disse que muitos agricultores guineenses foram ensinados as técnicas de compostagem para a adubação orgânica, pelo que, na ausência de fertilizantes químicos, podiam fazer recurso a estas técnicas que são muito boas para adubação do solo e deixarem de depender só de fertilizantes importados.
Mecanizar a agricultura
Óscar Vaz disse que o pais deve apostar na mecanização agrícola como estratégia essencial para garantir a segurança alimentar e nutricional, o que passa pelo investimento sério no setor agrário. Só desta forma que a Guiné-Bissau poderá combater a pobreza e reduzir a dependência de importação de cereais, permitindo investir em outros domínios de desenvolvimento social e económico.
Aliás, lembrou que, desde os primórdios da independência da Guiné-Bissau, a agricultura foi considerada a base da economia do país que emprega mais de 80% de mão de obra activa, mas que a ideia não está a ser materializada na prática.
Os sucessivos governos que dirigiram o país, relegaram o setor agrário para o terceiro plano, o que é bem evidente, mesmo no quadro do Orçamento Geral de Estado. em que é atribuida uma fatia muito baixa que não permite o investimento.
A exemplo disso, o setor está a deparar com escassez cada vez maior de recursos humanos, e os poucos que existem, a maioria já estão em idade de reforma e não há novos jovens que apostam em agronomia, devido à falta de condições laborais e os poucos quadros jovens do setor enveredam para outros empregos mais rentáveis, sublinhou o diretor.
Riscos de escassez de alimentos
Devido aos resultados das colheitas na região, os Serviços Regionais da Agricultura receiam que haja escassez de alimentos neste ano, por causa do insucesso da campanha, motivado pelas inundações que danificaram muitos campos agrícolas em diferentes setores e tabancas da região e falta de adubação de solos.
Não fala em fome, mas em situação preocupante que requer medidas urgentes para enfrentar uma eventual crise alimentar que poderá atingir várias famílias.
Disse que a Região de Bafatá, considerando ser o celeiro do país, por dispor de condições favoráveis à produção agrícola, rodeada de água doce e algumas partes de água salgada, o que lhe confere o estatuto de poder praticar dois tipos de agricultura (épocas seca e de chuva).
A região possui vastas superfícies de terras aráveis e apropriadas à prática da agricultura, desde bas-fond a magrove, passando por diversos tipos de culturas que possam garantir a segurança alimentar e nutricional. A região situa-se numa zona estratégica, fazendo fronteira com a República do Senegal.
Mas é preciso mais investimentos em termos de meios de produção, formação e reforço de capacidades dos agricultores, criação de infraestruturas e desenvolvimento de técnicas mais resilientes e adaptáveis às alterações climáticas.
Para Óscar Vaz, a Guiné-Bissau pode assentar o seu desenvolvimento apenas na agricultura, pois é o setor que emprega a maior parte da mão-de-obra ativa e concentra mais de 50 por cento da população guineense. O país possui condições naturais e potencialidades favoráveis que, se forem bem aproveitadas e valorizadas, poderão resgatar o país da situação da pobreza, sublinhou.
Recursos humanos
Em termos de recursos humanos, a Direção Regional da Agricultura enfrenta insuficiência de pessoal em quase todos os serviços sob sua dependência, sendo que a própria Direção conta, atualmente, com nove técnicos, sendo um quadro superior e oito médios, quase todos em idade de reforma, o que dificulta sobremaneira o seu desempenho.
O Instituto Nacional de Pesquisa Agrária (INPA), com sede em Contuboel, até a bem pouco tempo, contava também com cerca de 22 elementos, dos quais um superior, dois médios e 19 profissionais, mas sem meios materiais e equipamentos adequados à realização cabal das suas tarefas.
A nível dos serviços pecuários existem apenas 11 técnicos, sendo um superior, quatro médios, cinco profissionais, um auxiliar reformado, distribuídos pelos seis setores administrativos da região, o que é insuficiente para o desempenho integral das suas funções. O único técnico superior, Danga Benante, igualmente responsável regional da Pecuária, já está em idade de reforma.
De acordo com aquele responsável da Pecuária, a Região de Bafatá concentra enorme quantidade de gado bovino, ovino, caprino, suíno e galináceo, razão pela qual exige dos serviços pecuários um volume elevado de trabalho cujos recursos humanos não conseguem dar cobertura integral.
Meios materiais e equipamentos
Importa sublinhar que a Direção Regional da Agricultura de Bafatá enfrenta problemas de meios materiais e de mobilidade. Há uma única viatura afeta ao diretor que é partilhado pelos técnicos para a realização das missões de seguimento no terreno.
Esta situação, associada à insuficiência de recursos humanos e falta de motivação dos poucos técnicos existentes, limita a capacidade de intervenção dos serviços regionais para desempenharem eficazmente a sua missão e dar cobertura integral aos diferentes setores administrativos, sublinhou o diretor.
Exortou o Governo a dar maior atenção ao setor da agricultura como alavanca para o desenvolvimento do país, luta contra a pobreza, fome e insegurança alimentar, já que emprega a maior mão-de-obra ativa, o que passa, necessariamente, pelo aumento de investimento, criação de infraestruturas de apoio à produção, motivação dos técnicos e formação de novos quadros.
Contribuição das ONG
O diretor destacou também a enorme contribuição das organizações não governamentais nacionais e internacionais que intervêm na região, pelas importantes ações que estão a desenvolver em diferentes domínios, nomeadamente agricultura, pecuária, horticultura, conservação de florestas e meio ambiente, fornecimento de água potável e serviços de saneamento, saúde, educação, proteção e promoção dos direitos humanos, igualdade de género, promoção da arte e cultura, formação e reforço de capacidades das comunidades em prol da luta contra a pobreza e melhoria das condições de vida das populações.
Diversificação de culturas
Face às alterações climáticas que se registam cada vez mais no mundo e, em particular, na Guiné-Bissau, o que, de certa maneira, afetam o setor agrário e, em consequência, as culturas, o diretor regional da agricultura aconselha os agricultores a apostarem em culturas de ciclo curto, resilientes às alterações climáticas e de renda.
Só assim poderão fazer face aos fenómenos naturais imprevisíveis e garantir a segurança e soberania alimentares, pois a Guiné-Bissau é um país frágil e pouco preparado para enfrentar tais fenómenos. É necessária a adoção de estratégias que permitam atenuar tais riscos climáticos que afetam não só as pessoas como a fauna e as florestas.
Perspetivas para 2023
Para a campanha agrícola 2023, o diretor perspetiva empreender ações conducentes a promoção da agricultura mais resiliente e capaz de garantir segurança alimentar e nutricional às famílias de agricultores e a população em geral. O optimismo do diretor alinha-se com as intenções do atual ministro da agricultura, Botche Candé que, segundo o diretor regional, é um homem ambicioso, dinâmico e com influência que espera poder fazer algo de importante para o setor da agricultura. Mas, disse que tudo depende da estabilidade governativa e institucional que permitirá a execução dos projetos desenhados.
Disse que o ministro da tutela conseguiu do Governo do Senegal apoios substanciais, nomeadamente 500 toneladas de sementes de arroz, 500 toneladas de semente de mancara, 300 toneladas de fertilizantes diversas e máquinas de descaque de arroz e mancara.
Com estes apoios e de eventuais outros parceiros, irá ajudar significativamente no desenvolvimento das atividades de produção agrícola do país e exortou o Governo a apostar mais na agricultura se de facto queremos sair do lodo da pobreza, disse diretor.
No setor hortícola, o diretor lamentou a forma como o país importa hortaliças e legumes à partir do vizinho Senegal, uma vez que a Guiné-Bissau dispõe de melhores condições naturais favoráveis à produção hortícola, com terras aráveis, água suficiente e vastas superfícies.
Disse que a Guiné-Bissau não tem motivos para importar estes produtos e, pelo contrário, devia ser ela a exportar para os países vizinhos, particularmente para o Senegal, sublinhou Oscar Vaz.
Djulde Djaló