O país comemorou o Dia Internacional para Erradicação da Fístula Obstétrica, 23 de Maio, com mensagens que chamam atenção dos cidadãos sobre as consequências físicas, morais, económicas e sociais das vítimas deste flagelo que assola o mundo e a Guiné-Bissau não foge a regra.
Ficou claro que a fístula é quase totalmente evitável. Por isso, a sua persistência é um sinal de desigualdade global e uma indicação evidente de que os sistemas sociais e de saúde não estão conseguindo proteger a saúde e os direitos humanos das mulheres e meninas mais pobres e vulneráveis.
A comemoração sob o lema “OS DIREITOS DA MULHER SÃO DIREITOS HUMANOS!
ACABEM COM A FÍSTULA, AGORA!”, decorreu de forma restritiva devido a pandemia de coronavírus. Um programa comemorativo foi preenchido com diversas atividades com destaque para um debate radiofónico, transmitido em cadeia por quatro rádios, com especialistas e testemunhos de vítimas, que falaram da desigualdade social, dos direitos humanos, da pobreza, da descriminação, da injustiça social e das histórias de vida dramáticas, por que passam os doentes de fístula.
Em mensagens dirigidas, por esta ocasião, o Ministro da Saúde Pública, Dionísio Cumba e o Representante do UNFPA, Cheikh Fall, foram unânimes nos apelos à responsabilidade e engajamento para tornar realidade o fim da fístula, porque é uma doença evitável e curável, atualmente.
A fístula obstétrica é uma das lesões mais graves e trágicas do parto. Um orifício entre o canal do parto e a bexiga e ou reto. É causado por trabalho de parto obstruído e prolongado, sem acesso a tratamento médico de alta qualidade em tempo útil. Deixa as mulheres com vazamento de urina, fezes ou ambos, e muitas vezes, leva a problemas médicos crónicos, como depressão, isolamento social e aumento da pobreza.
Causa e Tratamento
A fístula ocorre quando o atendimento obstétrico de emergência não está disponível para mulheres que desenvolvem complicações durante o parto. É por isso que as mulheres que vivem em áreas rurais, aldeias e tabancas remotas, com pouco acesso aos cuidados médicos, correm maior risco.
A pobreza, desnutrição, serviços de saúde precários, gravidez precoce e discriminação de género são as principais causas interligadas da fístula obstétrica. Porém, a pobreza é o principal fator de risco social, porque está associada ao casamento precoce e a desnutrição, reduz as chances de uma mulher obter cuidados obstétricos oportunos.
Segundo estatísticas mundiais, na África Subsaariana as mulheres sofrem, quase, duas vezes mais com as doenças por causa da falta de acesso a saúde sexual e reprodutiva do que outras mulheres no mundo.
Cerca de 15 por cento de todas as gestações resultam em complicações que requerem intervenção médica de emergência.
Apenas 58 por cento das mulheres nos países em desenvolvimento dão à luz com a assistência de um profissional (uma parteira ou médico) e apenas 40 por cento dão à luz em um hospital ou centro de saúde.
A fístula pode ser tratada e, também, evitada. Através da cirurgia reconstrutiva pode-se, na maioria dos casos, curar a doença.
Infelizmente, nos nossos países em desenvolvimento, a maioria das mulheres que vivem com fístula não sabem que o tratamento está disponível e que não precisam pagá-los. Por outro lado, muitas unidades sanitárias não têm capacidades técnicas, equipamentos e pessoal suficientes para fazerem atendimento e tratamento de fístula.
A prevenção é a chave para acabar com a fístula.
Na campanha, que tem sido um sucesso, o UNFPA e parceiros garantem o acesso ao atendimento médico oportuno e de qualidade, para todas as mulheres grávidas e meninas adolescentes. Ainda, fornecem cuidados obstétricos de emergência para aquelas que desenvolverem complicações.
A organização trabalha em parceria com os Governos para aumentar o acesso à educação e serviços de planeamento familiar para mulheres, homens e adolescentes.
A Guiné-Bissau aderiu a campanha em 2010 graças aos quais já foram realizaram 305 cirurgias reconstrutivas.
A prevenção, mais do que o tratamento, é a chave para acabar com a fístula. Por isso, está-se a fazer uma aposta forte para tornar o planeamento familiar disponível para todos aqueles que o desejam, para se poder reduzir, consideravelmente, as mortes e garantir uma maternidade segura.
Durante a campanha, que serve também para sensibilização e identificação de casos, são abordadas as questões sociais como a gravidez precoce, o analfabetismo de meninas, a pobreza e a falta de poder das mulheres, o tratamento, aspetos importantes que podem ajudar a prevenir a ocorrência de fístula, principalmente.
Foi, em 2003, que o UNFPA e seus parceiros lançaram a primeira campanha global para acabar com a fístula. O objetivo geral é eliminar a fístula como um problema de saúde pública nos países em desenvolvimento, a semelhança do que aconteceu nos países desenvolvidos.
Portanto, a campanha serve para atirar a atenção dos formuladores de políticas, das comunidades, a questão da fístula e o público, em geral, para contribuírem na redução da estigma associada a doença e ajudarem as mulheres submetidas ao tratamento a viverem, novamente, as suas vidas normais. A campanha está presente em mais de 50 países do mundo nomeadamente, na África Subsaariana, na Ásia e na América Latina e Caraíbas.
Capacitação de quadros de saúde
Como líder da Campanha global pelo Fim da Fístula, o UNFPA oferece uma visão estratégica, orientação e apoio técnico, equipamentos médicos, treinamento e capacitação, bem como fundos para prevenção da fístula, tratamento e programas de reintegração social e defesa. Neste quadro o Fundo está a apoiar a formação e capacitação de três médicos nacionais, no domínio da cirurgia restaurativa da fístula. Graças a estas formações os médicos Siuna Guad, Usna Incanha e Malam Sabali, constituem a primeira equipa de especialistas na cirurgia de fistula, na Guiné-Bissau. A formação que teve início em 2019, ocorre em Bissau e Dakar, constituindo uma mudança importante no panorama sanitário guineense, no domínio da saúde reprodutiva. Os doentes agora não precisam de muito tempo de espera para serem submetidos ao tratamento da fístula.
Em 2020 foram realizadas 29 cirurgias de fístula no quadro da campanha. Este ano, 2021, através dos médicos nacionais, já foram realizadas três cirurgias reconstrutivas, uma verdadeira mudança de paradigma que vai contribuir para reduzir o tempo de sofrimentos dos pacientes de fístula.
Na Guiné-Bissau, as campanhas de tratamento da fístula, foram iniciadas em 2010, promovidas pelo UNFPA, através de médicos expatriados, nomeadamente senegaleses e moçambicanos, acompanhados pelos homólogos guineenses.
O tratamento da fístula, na Guiné-Bissau, depois da independência, foi realizado pelos médicos expatriados, no quadro do protocolo de acordos de cooperação com os países amigos, nomeadamente chineses, juguslávos, e cubanos. A enfermeira Helena Barai era a única técnica nacional que acompanhava os tratamentos.
Setenta e duas horas de terror
Djité Djum, da tabanca de Sintchan, Setor de Pirada, Leste da Guiné-Bissau, foi a primeira paciente a ser operada por um médico guineense, em 1991. Siuna Guad, médico Urologista, ponto focal do tratamento da fístula e Diretor dos Serviços da Urologia do Hospital Nacional Simão Mendes, foi responsável pela cirurgia.
Hoje, 30 anos depois, o reencontro foi de alegria e satisfação, porque viu a sua paciente bem disposta e sorridente. Foi um de muitos casos de sucesso que passaram pelas mãos fadadas dos nossos profissionais de saúde, ao serviço de uma profissão que juraram “salvar vidas”.
Djité Djum conta como venceu a batalha contra a dor e sofrimento, ao longo de 72 horas de serviço de parto, onde contraiu a lesão de fístula. O parto ocorreu em casa, na sua tabanca, sem assistência de pessoal qualificado. Hoje viúva e sem filhos, porque os dois que teve morreram. O primeiro, um nado morto em consequência do parto prolongado que sofreu, o segundo, que ainda completou quatro anos, morreu vítima de doença.
O encontro com Dr. Siuna foi numa consulta onde lhe foi diagnóstica a fístula, da qual padecia havia um ano. Foi descoberta numa das campanhas de sensibilização e identificação, organizadas pelos agentes de saúde. Uma única intervenção foi o suficiente para ficar curada e poder voltar a viver a sua vida normal. Deixou para trás os momentos de angústia, dor, sofrimento, humilhação e solidão.
“Obrigado doutor Siuna não há nada com a qual te posso pagar. Peço, simplesmente, ao Nosso Bom Deus que te proteja e a todos outros profissionais de saúde que cuidam de nós”, agradeceu Djité Djum.
“ Fístula pode ser evitada e curada”
– defende Cheikh Fall, Representante do UNFPA
A fístula obstétrica é uma doença devastadora para as mulheres que se não for tratada, pode causar infecções, doenças e infertilidade. É uma lesão de parto que provoca incontinência da urina e/ou da urina e fezes.
No entanto a Fístula Obstétrica pode ser evitada e curada!
O Fundo das Nações Unidas para a População, junto com os seus parceiros, lançou em todo o mundo, há doze anos, a Campanha Global para Acabar com Fístulas Obstétricas. A Guiné-Bissau aderiu a campanha e, com o apoio do UNFPA, de 2009 à 2020, 305 mulheres e meninas foram submetidas a cirurgias reconstrutivas com sucesso.
Está na hora de acabar com a fístula obstétrica e enfrentar as circunstâncias que a perpetuam, nomeadamente a pobreza, a falta de acesso a cuidados de saúde, o casamento infantil e forçado e gravidez na adolescência.
Temos os recursos e expertise?. É preciso vontade política para corrigir as desigualdades e proteger os direitos humanos de todas as mulheres e meninas, para que a fístula nunca mais possa arruinar a sua saúde, o seu bem-estar, a sua dignidade e a sua capacidade de participar e contribuir na sua comunidade.
“Procurem Centro de Saúde mais próximo”
– apela o Ministra da Saúde Pública, Dionísio Cumba
Ilustres Concidadãos
População da Guiné-Bissau
Dia 23 de Maio, celebra-se o dia internacional da Fístula Obstétrica, uma doença evitável e curável. Trata-se de uma doença contraída durante o trabalho de parto obstruído e prolongado. A Fístula Obstétrica provoca perda contínua de urina e/ou de fezes.
Na Guiné-Bissau o Ministério da Saude tem organizado campanhas anuais de tratamento cirúrgico de mulheres portadoras de fístula. Mais de 300 mulheres foram tratadas de fístula obstétrica com apoio financeiro do UNFPA.
As fístulas obstétricas podem ser, amplamente, evitadas, simplesmente, adiando a idade da primeira gravidez, cessando as práticas tradicionais prejudiciais e tendo acesso oportuno a cuidados obstétricos de qualidade.
A maioria das fístulas ocorre entre mulheres que vivem na pobreza, em culturas onde o status e a auto-estima de uma mulher podem depender quase, inteiramente, do seu casamento e capacidade de ter filhos.
Para concluir, gostaria de aproveitar este momento para sensibilizar e apelar toda e qualquer mulher com sintomas de fístula, que desloquem às estruturas de saúde mais próximas para serem observadas e diagnosticadas.
Termino citando o lema:
“Os direitos da mulher são os direitos humanos! Acabem com a fístula agora!”
Obrigado e Bem Hajam!
Texto: Aniceto Alves – Fotos: José Djú