Em termos de chuvas, 2020 foi um ano excecional para a Guiné-Bissau. Há mais de 20 anos que o país não registava valores acumulados como desta vez. Pelo menos, de 31 de maio a 4 de novembro choveu intensamente, isto é, mais do que o suficiente. Essa constatação foi transmitida ao Nô Pintcha pelo ponto focal da previsão climática, Cherno Luís Mendes, do Instituto da Meteorologia Nacional.
Segundo o técnico, em princípios do mês de abril, os Serviços Meteorológicos da África ocidental organizaram o fórum da previsão sazonal por vídeo conferência da qual se anunciou a probabilidade de haver chuva abundante na subregião.
A nível nacional, a Meteorologia já tinha previsto uma situação excedentária, que provocaria no país, um ano húmido, que significa uma época de chuvas abundantes com o seu impacto direto, particularmente nas zonas agrícolas. Pela quantidade das chuvas registadas, houve inundações um pouco por todas as partes, inclusive, muitos rios transbordaram o seu caudal.
Na explicação do Cherno Luís Mendes, a previsão faz-se primeiramente a nível de cada país da África ocidental e na base desta faz-se a previsão consensual regional. Entretanto, este responsável considera de positivo a quantidade das chuvas registadas em 2020 no território nacional.
“Quanto a precipitação registada, nós temos valores acumulados. Entendemos que a precipitação deste ano é fora do normal. Por exemplo, costumamos observar em Bissau uma precipitação anual que variava entre 1.000 a 2.000 milímetros. Este ano choveu abundantemente e os valores subiram para além de 2.000 milímetros”, sublinhou o Cherno.
A zona húmida, nomeadamente as regiões de Bolama e Tombali registaram ainda valores mais elevados. Praticamente, nos últimos 20 anos não se tinha registado valores iguais aos deste ano. Mesmo na zona leste do país, que costuma chover menos, este ano houve inundações, um pouco por todas as partes. Aliás, em todas as regiões registou-se inundações nas matas e bolanhas.
As causas fundamentais que estiveram na origem do ano húmido na África ocidental estão ligadas ao fenónemo “la niña” (a menina, traduzido do espanhol). Este fenómeno foi descoberto no oceano Pacífico, por pescadores peruanos.
Cherno Luís Mendes disse que tecnicamente, pode-se dizer, que são chuvas formadas na base das águas frias, expandidas na superfície do oceano Pacífico. Se fosse ao contrário, isto é, houvesse águas quentes na superfície do oceano Pacífico, podía-se registar escassez da chuva em muitos países da África ocidental. Significa que quando se tem água fria a nível da superfície do oceano Pacífico, obviamente registar-se-á chuvas abundantes na África ocidental, onde a Guiné-Bissau se encontra inserida.
“Mas também a nível do oceano Atlântico, temos dois pólos. O pólo Atlântico Norte e o pólo Atlântico Sul. O pólo Atlântico Norte está situado entre Senegal, Mauritânia e Marrocos. Mesmo se houver “el niño” no Pacífico, se tivermos situação quente no pólo Atlântico Norte, isto pode ajudar em termos de precipitação a nível da África ocidental. Se temos situação fria no pólo Atlântico Norte, mesmo que houver “la niña” no oceano Pacífico, regista-se escassez de chuva na África ocidental, sobretudo nos países limítrofes a este pólo, nomeadamente a Gambia e a Guiné-Bissau. É um fenómeno complexo.
Questionado sobre como é que se consegue estudar esta situação, Cherno Mendes respondeu peremptório: “através dos outros centros mundiais de meteorologia que fazem o seguimento dos fenómenos oceânicos em cada dia que passa. Temos o website a que exploramos e fazemos a análise da situação”.
Conforme a sua explicação, os cientistas estão em diferentes locais dos oceanos e através das estações eles fazem o seguimento diário dos fenómenos e produzem o mapa da evolução dos fenómenos em causa.
O ponto focal da previsão climática do Instituto da Meteorologia Nacional esclareceu que os técnicos nacionais analisaram a situação de maio a dezembro, em conformidade com a estação chuvosa da Guiné-Bissau. “Através da circulação geral da atmosfera (o ar), independentemente da distância, tudo o que acontece no oceâno Pacífico ou em qualquer outro oceano, chega a nossa zona”, sintetizou Luís Mendes.
Na pergunta sobre a situação no leste da Guiné-Bissau em que uma simples vista desarmada leva alguém a considerar de que é seca, o técnico da previão climática refutou o terno “seca” e disse que para eles falar da seca, é muito forte. “O que podemos falar é a questão da variabilidade das chuvas. Algum ano chove mais e outro chove menos. Falar da seca é estar a referir de valores menores de 200 milímetros, por exemplo”, argumentou.
Ele afirmou de que na zona leste da Guiné-Bissau, que chove menos, a Meteorologia ainda não registou sequer 500 milímetros de chuva. Sempre é mais do que esse valor. Mais em frente, Cherno fez anotar que pela quantidade da precipitação registada em 2020, o nape freático da Guiné-Bissau ficou completamente saturado. “Durante a época da chuva finda, vimos que alguns rios transbordaram o seu caudal. Isso ajuda na reabilitação das zonas que tinham deficiência de água”, observou aquele responsável da Meteorologia Nacional.
Ao que se refere a proteção das populações, Cherno Luís Mendes disse que a sua instituição fez o caso de alertar cedo os cidadãos nacionais e não só de que esperava-se haver um ano húmido, haveria fenómenos extremos, caso por exemplo de inundações, ventos fortes e com efeito avisamos o serviço nacional de proteção civil para estar preparado para eventuais catástrofes. Em várias localidades houve catástrofes originadas por ventos fortes e houve até perdas de vidas humanas. Que Deus perdoe todos aqueles que morreram na situação da chuva abundante
Oxalá que se repita mais anos húmidos, sem ventos fortes, se isto poderá ser a solução para a Guiné-Bissau e garanta uma produção agrícola suficiente de modo a haver mais segurança alimentar.
Bacar Baldé