Encerramento da empresa Sofargui: Fuga ao fisco na origem da problemática

diz Polícia Judiciária  

O fecho dos armazéns da empresa Sofargui pela Polícia Judiciária no passado dia 26 de mês de julho, por alegado uso do nome do Hospital Militar na importação de medicamentos e falta de documentação legal para o efeito, suscita interpretações contraditórias entre as instituições envolvidas no processo.

O ministro da Saúde falou da realização de um concurso público para o preenchimento de duas vagas existentes, de acordo com oordenamento jurídico farmacêutico, enquanto o inspetor-geral do Ministério de Saúde confirmou a realização de um concurso no qual participavam várias empresas, sendo três delas consideradas vencedoras, entre as quais a Sofargui.

Por outro lado, a PJ e a representação da Sofargui discordam sobre a mesma matéria. A Polícia Judiciária invoca o uso indevido do nome do Hospital Militar na importação, por parte dessa empresa, para fugir ao fisco e outros impostos.

Perante estas alegações, a Sofargui negou por completo a sua ligação ao Hospital Militar e no que diz respeito ao documento de autorização de importação, diz que a empresa tinha participado num concurso realizado em 2016, através do qual foi selecionada como uma das vencedoras, de maneira que nunca foi notificada em como aquele concurso foi anulado.   

Sofargui nega ligação ao Hospital Militar e considera fecho do armazém uma decisão de má-fé  

A Polícia Judiciária mandou encerrar há mais de duas semanas o armazém de stock de medicamentos da empresa Sofargui, alegando de que esta funciona de forma ilegal e, ainda por cima, importa medicamentos com rótulo do Hospital Militar sem autorização para o efeito.

Em entrevista ao jornal “Nô Pintcha”, o diretor comercial da Sofargui, Bubacar Embaló, disse que não compreende a atuação da Polícia Judiciária em mandar fechar as portas da sua empresa, alegando que a mesma não dispõe de documentos de importação.

Enquanto o assunto está sob a investigação da PJ, não quer pronunciar-se sobre isso, aguardando pela conclusão dos trabalhos. “Como disse anteriormente, não posso avançar qualquer tipo de informação, porque acredito que a Polícia Judiciária vai concluir a investigação o mais rápido possível.”

Segundo Bubacar Embaló, as suspeitas que poderão estar, provavelmente, na origem do encerramento da empresa encontram-se relacionadas com a falsa alegação da ligação com o Hospital Militar e, também, com a falta de documentos de autorização para operar no setor.

Neste momento, a Sofargui tem mais de 300 clientes a nível de farmácias privadas e, para além disso, também tem contrato de fornecimento de artigos com alguns hospitais e centros de saúde, como a farmácia do Hospital Nacional Simões Mendes, o Hospital de Bor, assim como outros centros regionais da capital.

Como Deus escreve direito por linhas tortas, no mapa de clientes que dispõe, o Hospital Militar não está na linha dos seus compradores, tendo garantido que nunca trabalhou em colaboração com este hospital.

Disse que a Sofargui é uma das primeiras empresas privadas a atuar no setor de importação de medicamentos e outros artigos na Guiné-Bissau.

Assim, em março deste ano, aquando do surgimento da pandemia da covid 19 no país, o Ministério do Comércio a contactou para ajudar no abastecimento do mercado com produtos alimentícios e medicamentos para poder fazer face ao surto do coronavírus.

Já lá vão alguns anos que estão a trabalhar na importação de medicamentos, aliás, neste momento é a principal fornecedora de medicamentos ao mercado nacional. Com o seu fecho, obviamente que vai provocar a rotura de medicamentos no país, por ser a única que importa medicamentos que foram registados no espaço da CEDEAO e da UEMOA. Neste sentido, não tem medo da qualidade dos seus produtos porque trabalha com uma empresa mais antiga da França, conhecida a nível de toda a Europa e do mundo pela sua credibilidade.

Informou que não há escassez de medicamentos. Os medicamentos encontram-se fechados no armazém.

Se a Guiné-Bissau adotou o comércio livre como forma de permitir a competitividade, então não vê razão de algumas empresas deterem o monopólio de um setor tão estratégico e vital para o país.

Medo da Sofargui

Em 2017, Carlitos Barai, na qualidade de ministro da Saúde Pública, concedeu autorização às empresas Salusfarma, Guifarma e Cecome como as únicas que podiam importar. Acontece, porém, que essas três empresas grossistas há três anos que enfrentam problemas financeiros graves, o que dificulta a sua missão de abastecer o mercado nacional.

Neste momento, a Guiné-Bissau precisa de, aproximadamente seis mil diferentes medicamentos em função das patologias existentes, mas essas empresas não têm capacidade para enfrentar essa situação. No Senegal, existem seis empresas grossistas e, mesmo assim, verifica-se falta de medicamentos, que fará num país que tem apenas três e, por cima, a enfrentarem problemas financeiros.

O Governo, na altura, entregou o monopólio a essas empresas que, porém, não estão a altura dos desafios. Muitos consideram a Sofargui como uma empresa pequenina mas que, na verdade, não é bem assim. Na verdade, ela é uma empresa genuinamente dos filhos da Guiné-Bissau, que entenderam bem o que este país precisa. Foi nesta base que decidiram criar a empresa para cobrir o vazio que existia no setor.

Disse que entrou no setor não por acaso, mas sim por ser a área da sua formação. Eis a razão por ter escolhido a área em que estudou para dar a sua contribuição como filho desta terra.

Mãos ocultas

Este país precisa de pessoas e empresas qualificadas para a mudança que se deseja. A Sofargui e seus dirigentes reúnem essas condições. Se alguém quiser provar isso, que a deixem trabalhar. Aliás, as condições para o funcionamento das empresas devem ser a qualidade e capacidade de resposta que devem ser colocadas à disposição de todos os guineenses.

Com o encerramento da Sofargui, muitos jovens foram lançados no desemprego. Quem sofrerá essas consequências são as suas famílias.

No período em que Domingos Malu foi ministro da Saúde Pública, foi lançado um concurso público no qual concorreram 12 empresas. Três dessas empresas foram consideradas vencedoras, entre as quais a Sofargui.

O primeiro critério anunciado para as empresas concorrentes era de que deviam apresentar uma garantia bancária de 300 milhões de francos CFA, mas que acabou por ser reprovado devido à falta de confiança entre as empresas e o governo na altura.

Depois, as partes chegaram à conclusão de reduzir o montante para 10 milhões de francos CFA.

A confusão começou quando Carlitos Barai assumiu o Ministério da Saúde, tendo decidido abrir um outro concurso sem nenhuma justificação plausível. Passado algum tempo, tiveram conhecimento de que tinham sido escolhidas somente duas empresas, violando a lei que conferia legitimidade a três empresas para operar no setor, conforme decreto publicado no Boletim Oficial no ano de 2010.

A anulação do referido concurso em que a sua empresa foi selecionada devia ser comunicada à parte interessada.

O mais caricato de tudo disseram que a Sofargui foi desclassificada, mas o Ministério da Saúde não devolveu os 10 milhões depositados na sua conta.

PJ confirma uso ilegal de nome do Hospital Militar pela Sofargui

O director nacional adjunto da Polícia Judiciária considerou a importação de medicamentos da parte da empresa Sofargui de contrabando, por estar a operar de forma ilícita, infringindo assim todas as regras estabelecidas.

Na opinião de Domingos Monteiro Correia, a importação de medicamentos sem respeitar as leis por parte dessa empresa pode dar lugar a um processo judicial por estar a cometer um atentado à saúde pública.

Disse que a Sofargui, independentemente de não constar na lista das empresas autorizadas para a importação, atua fora do quadro legal, violando as leis e normas que regulam o setor.

Segundo este responsável, a sua instituição tem ao longo dos últimos tempos assistido à entrada de inúmeros contentores de medicamentos importados por essa empresa, facto que levou a PJ a suspeitar e a enveredar pela investigação.

Durante os trabalhos de averiguações constataram que todos os medicamentos importados tinham o rótulo do Hospital Militar, sendo que esta entidade nunca chegou a importar medicamentos ou a encomendar a sua importação.

Depois de interpelarem os responsáveis da Sofargui sobre a utilização de etiquetas com o nome desse hospital, eles justificaram que a importação se fizera não em nome do Hospital Militar mas sim no do complexo hospitalar da Base Aérea, quando aquela unidade militar dispõe somente de um posto médico.

Segundo o diretor nacional adjunto, a Sofargui usa o nome do hospital militar sem conhecimento do Estado-Maior General das Forças Armadas e muito menos da direção desse hospital. Aliás, quando o diretor-geral daquele hospital foi chamado a prestar  esclarecimentos, ele mostrou desconhecimento total sobre o assunto.

Correia disse que durante os interrogatórios, os responsáveis dessa empresa confirmaram que nunca tiveram ligação com o Hospital Militar. Assim sendo, como é que foi possível encontrar rótulos de medicamentos com o nome desse hospital. E  alegaram que não tinham stock no armazém quando, na verdade, foram detetados medicamentos naquele espaço.

De acordo com o diretor adjunto da PJ, o processo já está sob alçada do Ministério Público a aguardar a sua tramitação legal.

Para Domingos Correia, a Sofargui não se encontra no grupo de empresas vencedoras do concurso público realizado pelo Ministério de Saúde, o que levou ao encerramento dos seus armazéns. Também foi aberto um processo-crime contra Polícia Judiciária Militar.

Ministério da Saúde fala na realização de concurso público

O ministro de Saúde, António Deuna, disse que a tão falada rotura de medicamentos é uma informação que carece de crédito. No que se refere ao Hospital Nacional Simão Mendes, diz que, enquanto titular da pasta da Saúde, não tem conhecimento sobre a matéria em causa, mas que irá com certeza ser informado, o que significa que este hospital não enfrenta esse problema.

Segundo o governante, ouviu também dizer que há falta de medicamentos a nível nacional, mas é bom esclarecer esse assunto, pois na Guiné-Bissau, de acordo com o ordenamento jurídico farmacêutico em vigor, deve haver três empresas privadas de importação de medicamentos e todas elas devem passar por um concurso público para poderem ter licença de importação.

O que está a acontecer no país neste momento é que só uma está a funcionar, a Salusfarma, mas de forma deficitária, o que poderá estar na origem dessa situação.

Perante isto, António Deuna informou que já instruiu os técnicos do ministério e da Alta Autoridade de Medicamentos para fazer um levantamento sobre a real situação que está a acontecer, porque o país não pode continuar a funcionar com uma única empresa. Quando assim é, haver a existência de monopólio no setor, o que não pode continuar. “Podemos até dizer que foi isso que levou à subida do preço de medicamentos nas farmácias. Quando a comissão terminar o seu trabalho de levantamento, o Ministério de Saúde Pública vai lançar um concurso público para o preenchimento de vagas existentes para poder resolver, de uma vez por todas, a situação de rotura de medicamentos”, garantiu.

Inspeção-Geral do Ministério da Saúde confirma existência de concurso público

O diretor-geral da Inspeção do Ministério de Saúde, Benjamin Lourenço Dias, informou que em termos oficiais não foi notificada pela Polícia Judiciária e que, assim sendo, não pode fazer um pronunciamento oficioso sobre o fecho da empresa Sofargui.

Disse que acompanharam todas as informações sobre encerramento daquela empresa através de órgãos de comunicação social e que, até ao momento, ainda não foram notificados pela PJ para darem pareceres técnicos a respeito do fecho da Sofargui.

Segundo o inspetor, o plasmado na legislação farmacêutica diz que qualquer instituição ou pessoa singular que detectar qualquer irregularidade sobre uma determinada farmácia ou empresa que importa medicamentos, deve comunicar de imediato à direção da inspeção para verificar se, de facto, houve ou não infracção. Caso se vier a confirmar, os serviços da inspeção confisca os medicamentos para depois entregá-los ao Ministério da Saúde.

Como não foram informados sobre o ocorrido, continuam a acompanhar o desenrolar do processo. “Dantes, sabíamos que o armazém tinha as mínimas condições exigidas para funcionamento. Agora, desconhecemos o estado do armazém, se continua a reunir as condições exigidas ou não. Se se chegar à conclusão de que a empresa pode reabrir as suas portas, como é que irá ser analisado o estado dos medicamentos que lá se encontram, uma vez que o país não dispõe de laboratório de certificação de qualidade. Nesse sentido, quem irá arcar com essas consequências será o Estado”, alertou.

Benjamin Dias mostrou que não tem muita coisa a dizer sobre o assunto, porque desconhece as razões que levaram ao fecho do armazém.

O inspetor-geral confirmou que a empresa Sofargui tem todos os documentos legais para operar no setor. Aliás, foi o Ministério de Saúde que deu autorização para o seu funcionamento, com base num concurso público realizado em 2016, onde três empresas foram selecionadas como vencedoras, estando entre elas a agora sancionada.

Fotos e texto: Alfredo Saminanco

About The Author

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *