Fraco uso de máscaras enfraquece a prevenção do coronavírus em Gabu

O aumento gradual de casos do novo coronavírus na Guiné-Bissau está, sobremaneira, a preocupar o Estado, as autoridades sanitárias e a população em geral. Mas, nos últimos tempos, constata-se que muita gente tem tido pouco cuidado com a sua transmissão.

O “Nô Pintcha”, em parceria com a Unicef, deslocou-se à zona Leste do país e registou que a maioria da população não usa máscara; que nalguns lugares públicos não existem baldes colocados para a lavagem das mãos e muito raramente se vê alguém a dirigir-se a alguma instituição e, à entrada, a desinfetar as mãos.

Embora as autoridades sanitárias e as organizações não estatais estejam empenhadas a desenvolver campanhas de sensibilização, no Leste do país continua-se a não respeitar o distanciamento social. As máscaras são usadas nas praças, locais onde se pode encontrar pessoal fardado, nomeadamente polícias ou militares. Nos bairros periféricos das cidades e tabancas mantém-se a realização de cerimónias de casamento tradicional, onde se glomera um elevado número de pessoas entre familiares, amigos e conhecidos.

População está ciente da existência da doença

Saico Umaru Embaló (Saiquinha) disse ao “Nô Pintcha” que no passado mês de março, a nível da Região de Gabu, foi criada uma estrutura denominada Comité de Pilotagem para aplicação de medidas de prevenção e combate ao novo coronavírus, do qual ele é membro, envolvendo todas as autoridades da região. Essa estrutura funciona sob coordenação dos líderes locais das organizações da sociedade civil que têm a responsabilidade de sensibilizar as populações acerca das orientações traçadas pelo Governo e pelas autoridades sanitárias do país relativamente ao combate contra o novo coronavírus.

O Comité de Pilotagem foi alargado aos setores administrativos e secções, facto que permitiu transmitir com facilidade qualquer informação relativa à sensibilização das populações acerca desta pandemia.

Até agora, Gabu regista apenas dois casos da covid-19, facto que anima o comité junto das comunidades locais a sensibilizá-las com o objetivo de as fazer empenhar-se ainda mais na sua prevenção e combate.

“Percorremos todos os cinco setores que compõem a região de Gabu e constatámos no terreno que as medidas de confinamento não permitem às pessoas exercer as suas atividades económicas, o que faz com que elas enfrentem carências em géneros alimentares. Transmitimos às autoridades regionais essa preocupação e solicitámos para que seja disponibilizado algum apoio às populações. Na sequência desta solicitação, a empresa de telecomunicações Orange-Bissau ofereceu 213 sacos de arroz. Esse donativo foi distribuído a todos os sectores, cabendo a cada secção oito sacos para distribuir à sua comunidade. Essa distribuição foi acompanhada de perto pelos membros do Comité de Seguimento Local”, sublinhou.

O ativista disse que os conterrâneos residentes na diáspora apoiaram de forma maciça o comité com baldes, lixívia, sabão, arroz, óleo alimentar, sardinha, etc., num valor aproximado de dois milhões de francos CFA. Com esse donativo foi criado a cesta básica e identificadas as tabancas através de comités de seguimento a nível de secções.

Só o Setor de Gabu conta com 219 tabancas. Em cada nove ou 10 tabancas formou-se uma comunidade que trabalha em estreita ligação com o comité de seguimento local. Em cada uma delas conseguiu-se identificar as pessoas mais carenciadas às quais foram distribuídas a cesta básica. O Governo também ofereceu arroz que foi distribuído pelo mesmo esquema.

A população de Gabu está ciente da existência da doença de covid-19 e tem conhecimento de como se pode livrar da sua contaminação. Foi um esforço grande das organizações da sociedade civil locais, contando também com o apoio das ONG internacionais casos, por exemplo, da plataforma das quatro ONG, dentre elas a “Ianda Guiné”.

A sensibilização das populações foi feita na base das orientações da OMS (Organização Mundial de Saúde), através dos seus panfletos. O treinamento dos ativistas para essa atividade foi feito nas instalações do Hospital Regional de Gabu, em forma de peça teatral. Os animadores foram preparados para falar em dialeto de cada comunidade. A nível da região foram formados 250 animadores, sendo 75 para o Setor de Gabu.

No que respeita as medidas de prevenção, nota-se a existência de alguns riscos em Gabu. Existem pessoas a usar máscaras ou a respeitar as recomendações da lavagem de mãos. Apenas os que se deslocam ao centro da cidade é que levam consigo a máscara. Nota-se mesmo a fraca exigência da Polícia que reduziu a sua intervenção.

“Falei com os polícias para os informar de que há casamentos por todo o lado. Com essa informação, eles concertaram ações com os militares e constituíram equipas que foram ter com os responsáveis das cerimónias nas suas próprias casas. Quando exigimos o uso de máscaras às pessoas, elas pedem-nos apoio ou dizem que estão à espera de apoio do Governo”, explicou Saico Umaru Embaló, do Comité de Pilotagem.

O ativista aplaude o desempenho das mulheres, sobretudo as que residem nas tabancas. Elas tiram o seu dinheiro, compram as máscaras e utilizam-nas. Elas estão muito bem sensibilizadas e conscientes do perigo que representa o coronavírus, particularmente as mulheres grávidas. A maioria das mulheres usa máscara, embora grande parte mantém-na debaixo do queixo. Neste aspeto, elas são diferentes dos homens, que na sua maioria não acata essa medida.

Em relação aos dois casos de coronavírus registados em Gabu, conforme relato de Saico Embaló, o estado de saúde desses pacientes mostra que eles encontram-se estáveis. Estão confinados nas suas residências e beneficiaram de géneros alimentícios por parte do Comité de Pilotagem, nomeadamente arroz, óleo de cozinha, sardinha, etc.

Ele está otimista de que se Gabu mantiver nos dois casos registados, isso significa que a região está de parabéns. No âmbito da sensibilização realizada, o Comité de Pilotagem recebeu apoios por parte do Governo Regional (50.000 francos CFA) e das associações dos comerciantes de Gabu. Também os cidadãos dos países vizinhos radicados em Gabu (República da Guiné, Mauritânia, Nigéria, etc.) ofereceram lixívia, baldes, sabão, etc. Houve uma empresa de combustíveis que ofereceu cerca de dois mil litros de carburantes.

Impacto do novo coronavírus na vida das mulheres

Djenabu Sanó é ativista das organizações da sociedade civil e ofereceu-se para fazer parte das campanhas de sensibilização. Ela confidenciou ao “Nô Pintcha” que a primeira dificuldade das mulheres no combate ao novo coronavírus é a sua falta de tempo.

“As mulheres estão muito ocupadas, tanto em casa como no mercado. Constatamos que elas estão sempre atarefadas, ora na cozinha, ora na venda de mercadorias no mercado, ora noutros trabalhos caseiros. Daí que elas preferem dialogar com os animadores apenas durante o seu tempo livre. E nós, para conseguirmos fazer o nosso trabalho, temos de ir ao encontro delas. Isto quer dizer que temos de estudar e saber quando é que elas podem estar livres. Temos de aguardar por uma oportunidade para podermos falar com elas”.

Apesar dessa falta de tempo, uma boa parte das mulheres está sensibilizada e, nestes termos, reconhece-se que elas compreenderam muito bem o perigo que o novo coronavírus representa para a sociedade. “Por iniciativa própria, muitas mulheres tomaram a decisão de colocar baldes de água, lixívia e sabão nas suas casas para a lavagem das mãos. Há mais mulheres do que homens a usar máscaras”, salientou.

Em relação às crianças, muitas delas vendem no mercado a mando das mulheres, sobretudo as raparigas, com o objetivo de apoiar na sobrevivência das suas famílias. “Eu acho que estas deviam ser bem orientadas pelas próprias mães quanto ao uso de máscara e de lavagem frequente de mãos. A criança que colocada a vender está exposta a contaminação. Ela convive no mercado com muita gente e que, por isso, devia estar mais bem protegida.”

Djenabu Sanó confessou que, em certas famílias, algumas mulheres não conseguem estar à vontade perante os animadores. Elas sentem-se incomodadas com os seus maridos, porque só podem falar com os ativistas caso sejam autorizadas pelos próprios.

Segundo a ativista, neste período de confinamento, a maioria dos homens está sentado em casa e sem ocupação. Eles ficam stressados e não conseguem lidar convenientemente com as suas esposas.

Em relação aos casamentos tradicionais, Djenabu Sanó discorda da sua realização e diz que se forem informados de antemão, dirigem-se ao local e sensibilizam as pessoas para o uso de máscaras, lavagem de mãos, respeito pelo distanciamento entre as pessoas e recomendam que se evite grandes aglomerações.

Impacto do novo coronavírus nas crianças

O novo coronavírus causou imenso atraso em termos de aprendizagem dos alunos na Região de Gabu. As escolas, na sua totalidade, estão fechadas. Infelizmente, no início do ano escolar de 2019/2020 os sindicatos dos professores decretaram greve nas escolas públicas. No momento em que a greve foi desconvocada, já no mês de janeiro, em curto espaço de tempo surgiu a doença da covid-19 que se alastrou em todo o mundo. Tudo parou.

Antes, apenas algumas escolas conseguiram lecionar durante cerca de dois períodos, casos do Liceu Regional Dr. Luís Fona Tchuda, a Escola 23 de janeiro situada nas imediações do quartel de Gabu, as privadas 25 de Abril e a brasileira, entre outras escolas comunitárias e de gestão participativa.  

O diretor regional de Educação de Gabu, Malam Opá Djawará, entende que a covid-19 deve ser considerada como qualquer outra doença. O importante é respeitar as recomendações dos técnicos de saúde e do Governo. “Que esta doença não seja o motivo de pararmos o nosso trabalho, se não teremos uma outra preocupação. Sem trabalho o país não se desenvolve”, afirmou.

Em relação ao distanciamento entre as pessoas, Malam Djawará disse que para a reabertura das aulas na Região de Gabu, os responsáveis vão estudar a melhor forma de a fazer, tendo em conta que essa situação pode provocar múltiplas reações. Por norma, as turmas devem ter até 36 alunos. Mas, como existem turmas com mais de 40 alunos, a direção vai estudar melhor essa distribuição. “Por causa da pandemia, não vamos excluir nenhum aluno. O bebé que só tem uma perna, a mãe é que sabe como transportá-lo às costas”, referiu o diretor regional, tendo acrescentado que para a abertura do ano letivo 2020/2021 a direção já tem preparado pessoal a altura.

No ano letivo 20018/2019, as escolas da Região de Gabu funcionaram com 272 professores efetivos, 307 novos ingressos e 269 contratados, o que totalizou 848 professores. A nível da região, o primeiro ciclo teve 33.692 alunos (até à 4.ª classe), o segundo ciclo 2.882 (5.ª e 6.ª classes), o terceiro ciclo contou com 2.816 alunos (7.ª a 9.ª classes) e o liceu teve 1.161 (10.ª a 12.ª classes), totalizando 40.551 alunos. “Verificámos uma queda grande devido às greves constantes no setor do ensino. Em consequência disso, muitos alunos abandonaram a escola pública, preferindo a privada onde não há greves de professores.

Pandemia e locais de culto religioso

Tcherno Aliu Buaró, chefe religioso e residente no Bairro de Nema-II, na cidade de Gabu, sugere que os cientistas de cada país juntem-se e estudem melhor as causas e consequências do novo coronavírus. Se for necessário, promover seminários de formação, dar às pessoas que têm conhecimentos académicos aprofundados a possibilidade de desenvolver pesquisas credíveis com vista a encontrar soluções ideais para o combate a essa pandemia. “É necessário tranquilizar as populações e estudar bem a história do aparecimento do novo coronavírus, perceber a sua rápida evolução, a forma como essa doença mata rapidamente as pessoas, etc,.”

Ele entende que não era necessário fechar os locais de culto religioso, nomeadamente mesquitas e igrejas, porque a questão da pandemia ultrapassa de longe a dimensão do homem, o cidadão do mundo.

“As autoridades têm de compreender, simplesmente, que o mundo e as criaturas que nele vivem têm o seu dono. Deus é o único dono do mundo. Ele é que tem o real poder e a real força de fazer tudo que Ele quer. A criatura simplesmente deve-Lhe obediência. Deus está revoltado com o comportamento do homem”, sublinhou o Alhadje Tcherno Aliu. Ele foi ainda mais longe ao mostrar que os próprios árabes da cidade de Meca cometeram um grande erro ao aceitar a decisão do fecho da Mesquita Sagrada, a Kaaba (Masjid Al-Haram). Mais tarde ou mais cedo pagarão caro esse compromisso. “Talvez as próximas gerações venham ser testemunhas disso. As mesquitas e as igrejas são lugares onde nos dirigimos diretamente a Deus. Onde está a fé do homem que ordena e aquele que executa o fecho da casa de Deus, interrogou o imame.

Enfim, a questão de combate à pandemia do novo coronavírus não é só preocupante como também conflituoso, uma vez que a doença não tem cura e tem provocado a morte de milhares e milhares de pessoas, particularmente nos países mais desenvolvidos do mundo, como se toda a ciência médica se tenha apagado. Cuidemo-nos da covid-19!

Por: Bacar Baldé

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