Ilhéu do Rei: Centro de saúde sem técnicos e única escola preste a fechar

O Ilhéu do Rei, é das vilas mais pertos da capital Bissau, mas em termos de desenvolvimento figura na última posição, porque ali falta quase tudo. Aliás, essa pequena localidade cercada de água faz parte do Círculo Eleitoral 24, juntamente com bairros de Cupelum, Santa Luzia e “Praça”. Essa localização geográfica coloca a ilha na lista de zonas periféricas da capital.

Ilhéu do Rei situa-se ao largo de Bissau, com uma distância de pouco menos de 10 minutos de navegação em piroga. De acordo com relatos de alguns moradores, atualmente o Ilhéu do Rei tem mais de mil habitantes, habitado maioritariamente por etnia papel seguido de balantas.

Os populares que vivem nessa localidade enfrentam enormes dificuldades, desde à falta de meios de transportes adequado e seguro, centro de saúde, estabelecimentos comercias e/ou mercado, campos agrícolas, água potável, entre outros.

Para sobreviver nessa vila, os homens dedicam-se essencialmente nas atividades de pesca enquanto mulheres na horticultura. Devido à falta de água, os moradores são obrigados, todos os dias, ir buscar esse líquido precioso em Bissau.

Além dessa situação relatada, também o repórter do jornal Nô Pintcha constatou uma outra situação bastante delicada, que tem a ver com o relacionamento entre professores a comunidade.

Assim, os professores acusam a comunidade de não ter a cultura de hospitalidade enquanto a comunidade, por seu lado, culpa os professores de falta de vontade de lecionar. Essa situação levou a escola a registar uma baixa de números de alunos inscritos, tendo a escola funcionado, neste ano letivo, com apenas 54 alunos.

Dada a especificidade da ilha, a população deveria, como disse alguém, acomodar os professores, o que não foi o caso. Perante esta situação, os professores são obrigados a residir em Bissau, devido à falta de condições, aliás, essa mesma situação levou o centro de saúde a ficar sem médico nem enfermeiro, porque entenderam que viajar de canoas todos os dias é expor suas vidas em risco.

Educação

Sobre a situação de ensino, o Nô Pintcha falou com a professora Janine Iracema dos Santos Dias, que na sua explanação reconfirmou que, de facto, enfrentam enormes dificuldades, a começar por desprezo na travessia e a falta de colaboração da comunidade.

Aquela educadora disse que todos os dias levantam às quatro de manhã para poderem chegar antes das oito horas na escola, mas são desmerecidos no porto pelos proprietários de canoas.

“Há dias em que ficamos lá até às nove horas a espera e, às vezes até às 10 horas. E há dias que não conseguimos mesmo travessar, embora nunca chegamos atrasado no porto, aliás, o único atraso é na travessia. Portanto, as aulas começam de acordo com a hora da nossa chegada”, esclareceu.

Na explicação de Janine Dias, não são consideradas como pessoas importantes naquela comunidade, porque se não teriam um tratamento diferente. “Imagine, inacianas as aulas fora de hora marcada, só isso já é um prejuízo, mesmo assim somos de novo obrigados a sair antes da hora, se não vamos ficar lá”.

Por outro lado, a professora disse que no dia em que saírem um pouco tarde, correm da escola até ao porto para não perder a carreira. Para evitar essa situação, saem quando falta um quarto para a hora de saída.
“Dar aulas nessas condições é extremamente difícil, mesmo com atraso na hora de chegada, os pais e encarregados de educação de alunos não facilitam, porque não mandam seus filhos para escola enquanto não chegamos. Muitas vezes nós é que saímos a procura de alunos casa-a-casa, porque se não fizermos isso não haverá aulas”, lamentou Janine dos Santos.

Segundo suas palavras, para criar uma boa relação entre professores e a comunidade, convocaram várias reuniões, mas mesmo assim a situação mantém na mesma, aliás, nesses últimos anos a conjuntura piorou, porque a comunidade os considera de intrusos, situação que acidou ainda mais essa relação.

“Se nos forem criadas condições não teremos problema de residir na ilha, aliás, isso vai nos ajudar muito no cumprimento de horas letivos, mas a comunidade entende o contrário, isso os leva a tirar seus filhos da escola. Os populares preferem mandar seus filhos para Bissau sem importar de risco de vida, como se a ilha não tivesse escola”, salientou.

Para Janine, o comportamento dos pais e encarregados de educação de crianças está a levar a escola à queda livre, porque daqui há alguns anos não vão ter alunos. Isso já se tornou moda, ou seja, cada ano letivo os pais mandam seus filhos para Bissau.

“Agora temos problema de alunos no terceiro e quarto ano. Prova disso é que neste ano letivo há somente quatro alunos no quarto ano, e 10 no terceiro. Como é que um professor vai sair de Bissau para vir dar aulas apenas a quatro ou dez alunos, portanto não temos outra escolha, somos obrigados a trabalhar nessas condições”, referiu.

A professora disse ainda que a escola pode lecionar até sétimo ano se a comunidade colaborar, mas, como devem saber, até na limpeza da escola a comunidade não participa, e só os professores não podem fazer milagre.

Falta de colaboração

Em reação à situação da escola, o inspetor-geral, Carlos Cuma, lamenta as péssimas condições que os professores trabalham sem contar com a pressão ligada ao transporte que é extremamente difícil.

Para Carlos Cuma, não é possível a ilha ficar sem canoa que possa fazer carreira regular, isto para ajudar na circulação de pessoas e seus bens.

Reconheceu que os professores trabalham num ambiente de muito sacrifício, provocado, primeiro, por falta de água na escola e, em segundo lugar, a falta de mercado ou de um estabelecimento comercial, para comprar, pelo menos, uma bolacha para saciar à fome. São conjunto desses fatores que contribuem no retrocesso no processo de ensino e aprendizagem dos alunos.

Na sua opinião, para inverter essa situação, a comunidade deve envolver-se seriamente, porque o atraso de professores em relação à hora de início das aulas não foi por culpa própria, mas sim a falta de colaboração de próprios moradores da ilha.

“Presenciei, várias vezes, situações onde os professores foram abandonados no porto sem poder fazer nada. Mas a comunidade, por sua vez, entende que esses não querem dar aulas e optam em matricular seus filhos em Bissau”, confirmou.

Igualmente, disse que já entregou vários relatórios ao Ministério da Educação sobre a situação da escola e de professores colocados no Ilhéu do Rei, mas nunca recebeu uma única resposta. “Desde que fui nomeado inspetor-geral nessa zona nunca recebemos a visita de um ministro da Educação e nem de altos dirigentes do ministério”.

Informou que, inicialmente, a escola não tinha sido contemplada no grupo de escolas que deveriam beneficiar de cantina escolar, mas graça ao seu esforço conseguiu integrar a escola dentro do programa, mas, infelizmente, os pais e encarregados de educação não estão a contribuir para o seu sucesso.

Por sua vez, o vice-presidente da Associação de Filhos e Amigos do Ilhéu do Rei, Hortênsio da Silva, disse que a conjuntura do país leva os jovens a refugiar-se em várias atividades para sobreviver.

Em relação às críticas levantadas sobre o comportamento da comunidade, disse que ele, enquanto responsável dos jovens, participou, algumas vezes, na limpeza da escola. “Agora somos responsáveis de famílias e cada um de nós tem sua ocupação e só no tempo livre que podemos ajudar”.

Hortênsio da Silva disse, por outro lado, que a população da ilha sente-se abandonada pelo Estado. Na sua explicação, Ilhéu do Rei é uma vila mais perto de Bissau e menos desenvolvida.

“Os Alunos que estudam em Bissau, às vezes, chegam atrasados, devido à insuficiência de meio de transporte. A única canoa que faz carreira é muito pequena, pelo que não consegue levar todos passageiros de uma só vez”, lastimou.

Alfredo Saminanco

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