O Procurador-Geral da República voltou à tona, na semana passada, com o “Caso Resgate”, que envolve o então Primeiro-ministro, Domingos Simões Pereira, tendo explicado detalhadamente como tudo terá acontecido.
Em conferência de imprensa, Bacar Biai referiu que em junho de 2015, Simões Pereira assinou uma carta a delegar o ministro das Finanças, Geraldo Martins, na altura, a iniciar negociações com o Banco da África Ocidental (BAO), com vista a conseguir um crédito de mais de 27.3 mil milhões de francos CFA.
Em novembro do mesmo ano, já com outro chefe do governo, Martins fez também negócios com o Banco da União (BDU), para um empréstimo de pouco mais de 7.9 biliões de francos, com uma taxa anual de juro de 1.5%.
Em relação ao dinheiro do BAO, segundo o PGR, diz-se que um bilhão ia para a cobertura do Orçamento Geral do Estado de 2015 e o restante era para o Estado comprar dívida dos empresários. Explicou que o contrato tem a duração de 10 anos, com uma taxa de juros anual de seis por cento (cerca de um bilhão em cada ano).
Nesse processo, disse, celebrou-se um “contrato secreto e irrevogável” em que o governo combina com os bancos a cobrar os devedores, tendo as instituições bancárias exigido uma comissão de cobrança em um por cento sobre o valor original da dívida para prestar esse serviço (no caso do BAO mais de 273 milhões e BDU mais de 79 milhões).
“Anexaram uma lista de 99 personalidades consideradas devedores ao banco e credores do Estado, mas apenas 10 delas eram verdadeiramente credores”, denunciou, revelando que, ao todo, o Estado da Guiné-Bissau deve pagar 35.227.274.993 francos, que corresponde a cerca de 5,5% do PIB nacional.
Bacar Biai fez saber que os fundos foram então transferidos do banco para a conta do Ministério das Finanças, de onde os levantamentos começaram a ser efetuados e detalhou como o processo foi feito.
Neste sentido, informou que, em todas essas movimentações, não existe nenhum documento justificativo, ou seja, tudo entra naquilo que é chamado Despesas Não Tituladas. “Temos de dar essas informações para lavar a nossa honra e das nossas famílias, pois fomos chamados de muitos nomes que não nos dignificam. Acusaram-nos de estar ao serviço de alguém. Além disso e tendo esses esclarecimentos, cada guineense poderá ajuizar a situação”.
No entanto, Biai esclareceu que nada tem contra o cidadão Domingos Simões Pereira, apenas está num normal exercício profissional, referindo que o Ministério Público (MP) dispõe mesmo de nomes das pessoas que fizeram o levantamento de tal dinheiro, mas não revelou.
Aquele magistrado explicou que o “Caso Resgate”, chegou às autoridades judiciais em 2015, através de uma denúncia feita por quadros do PAIGC e uma organização de luta contra a corrupção, adiantando que já em 2016, o MP teve acesso aos documentos e começou o procedimento legal, entrando em contacto com os bancos para apurar a veracidade dos factos.
“Então, entrámos com ação, enquanto os bancos continuavam a descontar o dinheiro ao Estado”. Esta operação só viria a ser cancelada em setembro de 2016, quando o Ministério Público entrou com uma providência cautelar (em agosto) para o efeito.
Comissão Bancária da UEMOA
Segundo Bacar Biai, ao tomar conhecimento de que o MP da Guiné-Bissau moveu uma ação contra alguns bancos, a Comissão Bancária da UEMOA veio pedir informações a respeito e, dias depois, criou uma comissão que foi inspecionar os bancos. Disse que todos os dados avançados nessa conferência de imprensa constam do relatório da Comissão Bancária da UEMOA, que, na altura, facultou cópias ao governo e ao Ministério Público.
Igualmente, declarou que, no mesmo sentido e tendo conhecimento sobre a situação, o Fundo Monetário Internacional (FMI) chamou a atenção de que a operação não estava correta e chamou-a de “créditos tóxicos”. E mais, alertou o executivo a anular o contrato, sob pena de suspender todas as relações com o país.
O mais caricato de tudo, segundo Bacar Biai, é que foi o Estado a pagar o advogado para os bancos. Só para a elaboração dos termos de contrato, as autoridades nacionais pagaram ao jurista cerca de três biliões e 20 milhões de francos CFA, ou seja, 2.457.871.992 milhões no caso do BAO e 653.745.648 milhões do BDU.
Entretanto, o PGR lembrou que o “Caso Resgate” deu origem a quatro outros processos, entre os quais 25/2016 contra Geraldo Martins, 25A contra o advogado (cujo nome não especificou) e 297/2018 contra Domingos Simões Pereira.
Partindo dos novos processos, revelou, o Ministério Público mandou ao parlamento o pedido de levantamento de imunidade ao deputado Domingos Simões Pereira e foi quando “todo o barulho” começou. E no seguinte, o magistrado titular do processo devolveu o mesmo, alegando não ter competências para julgar tal caso. “Não digo que o magistrado foi corrompido, mas a sua conduta indica que algo não estava a correr bem”, pois é um ato que deveria ter feito há mais tempo.
Por outro lado, Bacar Biai esclareceu que só pegou pessoalmente no processo do antigo Primeiro-ministro há cerca de três meses, porque o mesmo já ultrapassou as competências do Tribunal de Relação, já que Domingos Simões Pereira é agora presidente da ANP e quem compete julgá-lo é o Supremo Tribunal de Justiça, onde o MP é representado pelo Procurador-Geral da República.
A finalizar, o Procurador-Geral da República desafiou a todos que afirmam que o processo em causa foi arquivado ou há sentença, que apresentem provas.
Ibraima Sori Baldé